Setembro é o mês da mobilidade, desde meados dos anos 2000, mas o tema é a cada dia mais relevante para a vida urbana e sociedades em todo o mundo. O marco surgiu como uma bifurcação do Dia Mundial Sem Carro, criado durante a Semana Europeia de Mobilidade (em 1997) para incentivar as pessoas a deixarem seus carros em casa e optarem pelo uso de transportes coletivos, bicicletas ou a fazerem percursos a pé. De lá para cá, a mobilidade foi permeada por tecnologia e com a chegada da economia digital com motor de compartilhamento protagonizou uma revolução no comportamento social. Dia 22, o próximo Dia Mundial Sem Carro chega perto do fim do mês da mobilidade, mas, em meio à crise sanitária que demandou isolamento social, o tema relevante para o futuro sustentável segue sendo debatido sob novo contexto e olhar de gestões públicas.
Uma das grandes mudanças é a maneira como as pessoas escolhem se locomover por novo parâmetro; evitando maiores riscos de contato com o vírus. Boas práticas ao redor do mundo indicam que mobilidade compartilhada e sob demanda devem atuar de forma complementar ao sistema público de transporte que tende a ser mais orientado por dados para evitar aglomerações. É fato o crescimento da demanda por esse serviço em vários grandes centros urbanos. Em Nova Iorque, o número de viagens pelo sistema de bicicletas compartilhadas da cidade (Citybike), em março desse ano, teve aumento de 67%. Em Pequim, na China, a alta foi de 150% no mesmo mês. E no Brasil, qual o reflexo dessa mudança de hábito?
Um guia para a mobilidade brasileira ir mais longe
Quem impulsiona essa movimentação e promove ações que representam o setor é o Comitê de Mobilidade Urbana da Associação Brasileira Online to Offline (ABO2O), sob a liderança de Lilian Lima, representante da área de Políticas Públicas e Relações Governamentais de uma das maiores empresas Ride-Hailing (carona remunerada) em operação no Brasil, pertencente à líder global do setor de aplicativos de mobilidade; a chinesa Didi Chuxing (“DIDI”, que opera em outros 9 países: Chile, Colômbia, México, Costa Rica, Panamá, Austrália, China, Rússia e Japão) e atingiu recentemente (dia 25 de agosto) a marca de 50.000.000 de corridas em 24 horas (corridas bikesharing, táxis, carros particulares, serviços de entregas e caronas).
“Em janeiro desse ano passei a assinar como Public Policy 99 Didi Chuxing, que é associada ABO2O desde que a mobilidade se tornou uma das verticais da entidade voltada à legislação do setor. Considerarmos o trabalho por meio das associações fundamentais. Na área de relações governamentais sabemos o quanto é importante posicionar o setor corretamente e me candidatei à eleição para manter a cadeira que a 99 já ocupava na liderança do comitê. As decisões entre os membros são democráticas e para a 99 fazia sentido dar continuidade à agenda na qualidade de empresa de mobilidade urbana com a principal solução dentro do Ride-Hailing. Foi muito importante eu conquistar a posição e ter a oportunidade de construir essa agenda com outras empresas de mobilidade, como a Tembici, a Cabify e de delivery, como a Loggi, por exemplo, incluindo as perspectivas de startups em início de atividades”, pontua Lilian Lima.
“Esse é o principal conceito do comitê; construir agenda propositiva e posicionamento de forma coletiva e representativa de empresas com tecnologias e portes diversos do segmento. Realizamos assembleias mensais e extraordinárias, mas nesse mês dedicado ao nosso setor promovemos uma programação intensa de debates. Faremos uma entrega que promoverá avanços e orientará melhores práticas nesse cenário de alta demanda legislativa e regulatória no Brasil frente à tendência mundial de mobilidade integrada pós-Covid-19; o Guia de Mobilidade Urbana”, a ser lançado nos próximos dias, anuncia a líder do comitê.
Parceria Delivery e Mobilidade Urbana para entregas sustentáveis
O setor muda, a tecnologia é veloz e há novas demandas. “Sentimos necessidade de criar outro comitê com o qual interagimos, dedicado ao Delivery & Logística, segmento imerso na questão regulatória das atividades, principalmente dos entregadores. Com o desdobramento, dentro do Comitê de Mobilidade Urbana focamos nas transformações que a sociedade vem sofrendo com a pandemia. As pessoas mudaram hábitos de deslocamento, pensam diferente na hora de escolher os meios de transporte e em como se adaptar enquanto empresas buscam soluções para atender o novo perfil. Esse questionamento é contemplado no Guia de Mobilidade Urbana, que orienta a partir desse novo normal próximos passos sentido a um futuro com cidades mais sustentáveis, integradas e intermodais; sem perder avanços já conquistados”, diz a especialista.
Por dentro das mudanças de hábitos na periferia
O comitê avalia dados emblemáticos sobre mudanças recentes apurados por associadas, conforme compartilha a coordenadora: “um deles, da 99, apresentado durante o Summit de Mobilidade Urbana 2020, aponta que o aumento da utilização do transporte ativo por pessoas da periferia durante a pandemia foi de 55%. Outro dado relevante vem do estudo feito pela Tembici junto à Rede Nossa São Paulo: 38% das pessoas declararam que quando não houver mais necessidade de isolamento social pretendem se deslocar mais a pé e 20% usar mais a bicicleta. As pessoas redescobriram a mobilidade ativa na capital e estão recorrendo mais ao transporte por aplicativo tentando evitar transporte com maior aglomeração”.
Os dados das periferias sinalizam tendência que fez empresas pensarem na sustentabilidade da demanda e em soluções para locomoção de forma compartilhada e segura dentro do transporte por aplicativo. “A própria 99 apresentou uma opção dentro do serviço do Pop pelo qual pessoas podem compartilhar viagens, de acordo com as restrições e normas de segurança em razão da crise sanitária. O 99 Entrega foi outro novo serviço de transporte lançado pela plataforma em três capitais brasileiras, no início de junho desse ano, que hoje atende dezenas de municípios brasileiros”, exemplifica Lilian, referindo-se à iniciativa da empresa em que atua e auxiliou motoristas do aplicativo afetados pela baixa no movimento no período de isolamento social, além de ter viabilizado alternativa para envio e recebimento de itens com baixo contato físico.
Para frente é que se anda
A integração, tendência que caminha a passos mais largos em lugares onde o compartilhamento de informações em tempo real e a inclusão de novas formas de pagamento são viáveis; as plataformas digitais podem integrar e facilitar o acesso aos diversos serviços de transporte com ampla participação na gestão da mobilidade. Inteligência e dados permitem às plataformas MaaS (Mobility as a Service) o direcionamento de fluxos e controle inteligente dos níveis de aglomeração no transporte coletivo com o uso de modais individuais. Segundo avalia a liderança do comitê, “esse é o principal atual desafio para mobilidade urbana. Como nos mostrarmos solução para uma mobilidade (e sob esse contexto o delivery entra na nossa pauta) mais eficiente, sustentável e integrada à nossa realidade? Se há coisas positivas que a pandemia trouxe foram formas de a gente pensar e repensar a nossa dinâmica na cidade”.
Plataformas apoiam o futuro e a mobilidade em novo patamar
O Brasil terá uma longa jornada estrutural. Com base no repertório adquirido por meio da representatividade do setor e formação, Lilian Lima analisa: “em São Paulo, por exemplo, a cidade mais próxima de alguma integração ainda há dificuldade de conexão entre EMTU – SP (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos) e SPTrans (empresa que gerencia o transporte público da capital paulistana). A consultoria McKinsey & Company aponta em pesquisa recente que a integração entre os modais permite acomodar 30% mais tráfego com redução de 10% de congestionamento. Falar de integração é tratar de melhoria do trânsito.
“A agenda moderna de mobilidade urbana bebe na fonte da economia compartilhada, com soluções factíveis e complementares ao transporte público, que hoje já se mostram eficazes para um futuro mais sustentável e devem andar juntas para desafogar as vias públicas e dar fôlego ao meio ambiente diminuindo poluição atmosférica e sonora. Segundo pesquisa FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), no Brasil, um carro de motorista parceiro de aplicativo retira das ruas outros 17 carros que fariam viagens individuais. Em lugar de ter que estacionar um carro próprio o passageiro que tem opção de escolha para fazer cada trecho de seu percurso age no coletivo e faz a mobilidade acontecer”, pondera a especialista que sinaliza alguns obstáculos para avanços na pauta setorial pegando a via de transporte público.
“Aqui há dois gargalos para viabilizar a integração do MaaS (mobility as a service). Para a integração física (já em andamento em algumas cidades brasileiras) falta conectar os diversos meios de transportes, mas é essencial integrar também dados (sem meios de pagamentos não é possível garantir a fluidez necessária aos diversos modais se comunicando) que demanda infraestrutura a ser disponibilizada e implementada”, ressalta.
Em cidades maiores, como São Paulo e Rio de Janeiro, vemos um pouco mais desse esforço sendo realizado, mas o comitê sob a liderança de Lilian Lima tem no radar iniciativas no Brasil, de Norte a Sul, e conta: “nas menores o desafio é grande. Acompanhamos uma iniciativa positiva no Vale do Itajaí, (SC) que está em processo inicial de tentativa de integração. A maior dificuldade é a integração de pagamentos e dados, principalmente nos pequenos municípios. Em lugar esperar mais recurso federal, a busca pela integração é a alternativa para tornar o transporte mais eficiente e sustentável ao diminuir a dependência de recursos que subsidiem o transporte, são poucas as cidades que conseguem; São Paulo é uma das poucas que possui”.
Sobre a grande quantidade de Projetos de Lei rodando, a liderança comenta: “o Congresso recorrentemente diz que não há subsídio para a demanda de transportes. Dependendo unicamente de tarifas, a sobrevivência do transporte público fica constantemente ameaçada, especialmente, em tempos de crise. Como setor, as plataformas mostram protagonismo diante da pandemia que evidenciou que os desafios que vivemos não são somente da sociedade civil ou do governo, vimos a iniciativa privada proativa com relevância social. Acreditamos que falar em mobilidade urbana, sustentável, integrada; de cidades mais acessíveis a todos, é um esforço coletivo. As plataformas se colocam a pensar soluções para problemas e à disposição. Vivemos intensamente esse momento que gerou iniciativas solidárias do setor”.
Inverno de pautas quentes no hemisfério Sul para a mobilidade florescer mais sustentável
Os modelos de negócios das empresas de tecnologia, transportes por aplicativos, compartilhamento de bikes e delivery são novos, mas altamente regulados. A gig economy é, além de tendência do futuro do trabalho, matéria de uma das pautas mais quentes da atualidade. O Projeto de Lei (1665/2020), de autoria de Ivan Valente (PSOL / SP), que dispõe sobre os direitos dos entregadores que prestam serviços a aplicativos de entrega durante o estado de calamidade pública decorrente da pandemia, aguarda despacho do Presidente da Câmara dos Deputados e aquece o debate. “Representamos empresas que atuam no mesmo ramo como concorrentes, mas juntas dimensionam melhor do que qualquer uma delas poderia fazer isoladamente o quanto impactamos a economia. Quando tudo parou durante a pandemia, seguimos garantindo o deslocamento das pessoas, além de emprego e renda a motoristas e entregadores de aplicativos.
Ajudamos como setor a chegar a um denominador comum, a uma narrativa correspondente à realidade que o legislador entende. Podemos ir além. As empresas do setor podem oferecer subsídios e colaborar com planos de mobilidade das cidades, disponibilizar dados não sensíveis, anonimizados em conformidade com o que a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) exige. A 99, por exemplo, disponibilizou mapas de fluidez para a cidade de São Paulo, que ajuda a repensar deslocamentos. O Comitê de Mobilidade Urbana desenvolve iniciativas junto ao poder público para construirmos o cenário desejável juntos”, afirma a liderança convicta do papel setorial apoiada por visão holística do mercado, suas credenciais como profissional de uma plataforma que opera globalmente e conhecimentos nas áreas de gestão, políticas públicas e relações governamentais”. Às vésperas da troca de estação, do fim de um inverno de pautas quentes na expectativa de que boas novas para a mobilidade nacional floresçam, Lilian guia o porvir: “seguiremos na luta, que, no Brasil, é pela redução da burocracia para que as empresas cresçam e se fortaleçam”.