A parceria entre o Movimento Inovação Digital (MID) e o escritório Peck Advogados, pelo segundo ano consecutivo, atuará no fortalecimento das pautas que interessam a maior comunidade de empresas da economia digital.
Marcos Carvalho, diretor geral do MID, celebrou a continuidade da parceria com o escritório, que vai contribuir, mais uma vez, com o vasto conhecimento sobre o direito digital. “O suporte da Peck Advogados na construção de agenda setorial, em favor do ecossistema digital, visa aprimorar as melhores práticas de conformidade e governança em proteção de dados, inteligência artificial, cibersegurança, entre outros assuntos”, afirma.
Plataformas digitais
Um dos assuntos que interessam ao MID é o debate sobre o Projeto de Lei (PL) que propõe a regulamentação das plataformas digitais pela Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL)e já tramita no Congresso Nacional.
De acordo com o autor do PL 2768/2022, deputado João Maia (PL/RN), o objetivo “é assegurar um mercado mais competitivo e equilibrado”.
Em fevereiro deste ano, o Grupo de Trabalho (GT) sobre Regulação de Plataformas, do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), divulgou um relatório intitulado “Ações e diretrizes para a regulação de plataformas digitais no Brasil”, “fruto da sistematização de debates multissetoriais que reuniram diversos especialistas em um seminário e uma oficina realizada em setembro passado”.
Com uma lista contendo onze sugestões de “ações” a serem consideradas pelas organizações que compõem a governança da internet e outras 23 “diretrizes” para orientar um processo regulatório, o documento foi estruturado em quatro temáticas: critérios e abordagens; economia, concorrência e modelos de negócios baseados em dados; transparência e prestação de contas; moderação de conteúdo e recomendação algorítmica.
O MID pediu para Leandro Bissoli, sócio do Peck Advogados, escritório especialista em Direito para Inovação, comentar as medidas sugeridas pelo GT do CGI, e dar também mais detalhes do PL, explicando sobre o estágio em que o Projeto se encontra assim como os seus principais pontos polêmicos. Confira a entrevista na íntegra abaixo.
MID – Em suma, o que é o PL 2768/2022? Como ele poderá impactar as principais plataformas de negócios em atividade no Brasil?
Leandro Bissoli – O Projeto de Lei (PL) nº 2768/2022, de autoria do deputado João Maia (PL/RN), propõe a regulamentação das plataformas digitais no país pela Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) para assegurar um mercado mais competitivo e equilibrado. Para cumprir as novas atribuições da ANATEL é proposta a criação do Fundo de Fiscalização das Plataformas Digitais (FisDigi) com taxa de fiscalização a ser paga pelas plataformas digitais que detêm poder de controle de acesso essencial.
Além disso, o Projeto de Lei traz alterações no Marco Civil da Internet com a criação de novas entidades jurídicas: operadores de plataformas digitais, usuários profissionais e usuários finais das plataformas bem como estabelece as sanções por descumprimento pela lógica de “regulação responsiva” – modelo regulatório baseado em punições – comando e controle.
É um Projeto de Lei inspirado no Ato de Mercados Digitais (DMA – Digital Market Act) aprovado pela União Europeia em julho do ano passado para coibir a concentração de mercado pelas Big Techs.
MID – Quais os pontos que podem gerar polêmica, segundo a avaliação do Escritório?
Leandro Bissoli – Com a introdução da figura jurídica denominada “operador de plataforma digital”, o legislador estabelece que a sua prestação de serviço é classificada como serviços de valor adicionado (SVA). Como resultado, a ANATEL se torna responsável pela regulamentação e fiscalização desses serviços, com o poder de impor uma série de obrigações, como a separação contábil e funcional, além de medidas de mitigação em caso de abuso de poder econômico. Essas medidas incluem a portabilidade de dados e a interoperabilidade, visando garantir um mercado mais competitivo e equilibrado.
Quando os operadores destas plataformas digitais auferirem receita operacional anual igual ou superior a R$ 70 milhões com a oferta de serviços ao público brasileiro serão consideradas como detentoras de poder de controle de acesso essencial. Esta categoria de plataforma digital passa a ter as seguintes obrigações:
- Transparência e fornecimento de informações à Anatel sobre a prestação de seus serviços;
- Tratamento isonômico e não discriminatório na oferta de serviços a usuários profissionais e usuários finais;
- Utilização adequada dos dados coletados no exercício de suas atividades; e,
- Não recusa de provisão de acesso à plataforma digital a usuários profissionais.
Outro ponto que irá gerar uma grande polêmica será o Fundo de Fiscalização das Plataformas Digitais – FisDigi, sendo uma de suas fontes de receita uma taxa de fiscalização cobrada das plataformas digitais detentoras de poder de controle de acesso essencial no valor de 2% (dois por cento) da receita operacional bruta.
MID – Qual é o atual estágio no debate desse PL no Congresso? Já foi designado um relator? Quem é?
Leandro Bissoli – Já foi designado o Relator, deputado Laercio Oliveira (PP-SE) e no final do ano passado encerrou o prazo para apresentação de emendas ao Projeto de Lei. Não foram apresentadas emendas ao Projeto de Lei. Atualmente ele aguarda análise e parecer em caráter conclusivo pelas Comissões:
- Desenvolvimento Econômico (CDE);
- Ciência, Tecnologia e Inovação (CCTI);
- Finanças e Tributação (CFT);
- Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC)
Até o momento não foram apresentados os pareceres das Comissões. Temos que acompanhar o interesse do governo em pautar o tema.
MID – Há um estudo do CGI.br sobre o tema. Nele, eles listam 11 medidas para a regulação das plataformas. Poderia resumir as sugestões? O que achou?
Leandro Bissoli – O relatório foi produzido de forma colaborativa, envolvendo especialistas do setor em debates. As ações e diretrizes abrangem uma ampla gama de tópicos, como a definição de aspectos e princípios para um modelo sistêmico de regulação, a definição do escopo da regulação, a criação de um órgão regulador, a proteção dos direitos fundamentais em relação aos algoritmos de inteligência artificial e moderação de conteúdo, a conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e a adequação da remuneração de conteúdo jornalístico em plataformas digitais. O relatório também destaca a importância da transparência nas informações relacionadas ao funcionamento das plataformas e do desenvolvimento de algoritmos e IA que protejam os direitos fundamentais.
Destaco abaixo as ações apresentadas:
- Ao tratar do tema de regulação das plataformas digitais, o relatório apontou as seguintes ações:
- Definir aspectos, questões e princípios que devem ser considerados no desenvolvimento de um modelo sistêmico de regulação de plataformas digitais para o Brasil – Ou seja identificar e estabelecer os principais elementos que devem ser levados em consideração ao desenvolver um modelo sistêmico de regulação de plataformas digitais para o Brasil. Isso pode incluir considerações sobre a natureza das plataformas digitais, suas características e funções, bem como as implicações sociais, econômicas e políticas da regulação dessas plataformas. Ao trazer o “desenvolvimento de um modelo sistêmico de regulação” temos a criação de um conjunto de regras, normas e procedimentos que devem orientar as operações das plataformas digitais. Isso pode incluir a definição de diretrizes sobre a privacidade, a segurança dos dados, a transparência das práticas comerciais e outras questões relevantes relacionadas a suas operações.
- Definir o escopo de uma regulação de plataformas no Brasil, bem como a abordagem a ser adotada pelo CGI.br. Apresentado que a regulação deve possuir características abrangentes (diretrizes) como específicas ao setor, considerando a diversidade do setor.
- Definir um único órgão regulador para tratar das plataformas digitais, onde o PL traz a ANATEL;
- Viabilizar a construção da agenda regulatória por meio de um processo multissetorial.
A defesa da concorrência, o desenvolvimento socioeconômico e a soberania digital também foi apontado como um tema relevante na discussão. Como ação foi proposto:
- Dar clareza nos mecanismos da LGPD que devem orientar uma estratégia para a economia de dados, incluindo procedimentos de fiscalização do cumprimento da Lei pelas empresas. Reforçando a importância da conformidade com a LGPD.
- Sobre o tema transparência em relação ao funcionamento das plataformas e da publicidade online e os desafios apresentados para prestação de contas das grandes plataformas, trouxeram:
- Ampliar a transparência de informações relacionadas ao funcionamento das plataformas
- Orientar o desenvolvimento de algoritmos e Inteligência Artificial (IA) para que se baseiam e protejam direitos fundamentais, acompanhando as discussões sobre a regulação do tema;
- Criar um fórum permanente, multissetorial e independente para monitorar a moderação de conteúdos nas plataformas digitais e definir mecanismos de governança que contribuam com o escrutínio público sobre princípios, diretrizes e critérios de moderação de conteúdos em plataformas digitais.
Em relação a moderação de conteúdo e recomendações algorítmicas foram discutidos os mecanismos usados pelas plataformas para remover e bloquear contas e conteúdo, recomendar ou reduzir o alcance de publicações, os direitos dos cidadãos e cidadãs, assim como procedimentos de apelação de tais decisões. Desse modo apresentaram como ações:
- Produzir uma definição de moderação de conteúdo que seja consensual
- Produzir um código de conduta que estabeleça princípios, diretrizes e procedimentos para as atividades de moderação de conteúdo das plataformas digitais no Brasil
- Estabelecer mecanismos para adequar a remuneração de conteúdo jornalístico em plataformas digitais