Rodrigo Soeiro é o novo líder do Comitê de Payments & Fintechs do Movimento Inovação Digital (MID). CEO e co-Founder da Monnos, o primeiro Cryptobank brasileiro, o especialista quer aproveitar a reunião de empresas de peso no mercado de inovação local para adotar uma postura mais arrojada, “acompanhando e implementando as iniciativas inovadoras que já nos cercam para nos diferenciar em âmbito local e global de forma realmente abrupta”.
Com uma vasta experiência profissional, atuando há mais de dez anos exclusivamente no setor de tecnologia financeira, Soeiro contou ao blog do MID suas propostas a frente do Comitê, suas expectativas em relação ao mercado de fintechs, seus desafios e sua percepção sobre o setor como um todo.
MID- De maneira geral, como você enxerga o mercado de fintechs atualmente?
Rodrigo Soeiro – Vejo o mercado de fintechs como um ambiente em constante mutação, algo que, inclusive, se dá com muita velocidade. O que vemos atualmente, além das disrupções trazidas pelo blockchain e tokenização, é a aplicação da Inteligência Artificial no dia a dia financeiro. Ainda é cedo para dizer e prever as possibilidades, mas há indícios de impactos profundos. Assim, dado este cenário dinâmico, trata-se de um terreno muito fértil para startups, pois são elas as mais ágeis em inovar e implementar.
MID – O mercado de cripto sofreu algumas oscilações recentemente. Como você avalia este mercado hoje e quais as principais tendências?
Rodrigo Soeiro – O mercado de cripto segue passando por grandes oscilações, algo natural em um ecossistema ainda em maturação. Ao mesmo tempo, todos estes desafios têm criado empresas resilientes, que têm se reinventado recorrentemente. Assim, com o avanço em infraestrutura, teremos a criptoeconomia cada vez mais próxima do dia a dia das pessoas, algo que tende a atrair ainda mais usuários. Segundo pesquisas, o número atual é algo próximo de 300 milhões em todo o mundo.
MID – Em termos de tecnologia, quais as principais tendências na sua opinião?
Rodrigo Soeiro – É a tokenização de tudo. Estamos falando de voltar a era do escambo, da tokenização de ativos reais: imóveis tokenizados, comodities tokenizados, outros ativos financeiros tokenizados. E aí começa a ter um trânsito de tudo com outros ativos, onde troca-se de tudo. Ao mesmo tempo, temos também a tokenização de programas de fidelidade, por exemplo, que faz muito sentido para que você possa transacionar também esse ativo. Na prática, vemos que tudo pode ser democratizado e distribuído com muito menos intermediário, com muito mais simplificação, sem muita fricção no processo, de maneira fluida e mais fácil de ser utilizada.
Por exemplo: ao cancelar uma passagem aérea, dificilmente você vai receber o estorno daquele recurso financeiro que você gastou na compra. Se você tokenizasse as passagens aéreas, poderia deixar ela pública para que outra pessoa fizesse a aquisição, por um preço com desconto, mas não com tanto desconto como você tem quando cancela ou precisa alterar. Outro exemplo: quando você começa um consórcio e por algum motivo quer desistir. Se tokenizasse, teria a oportunidade criar um mercado secundário de venda em que você reaveria parte do seu recurso.
MID – Quais os principais desafios a curto, médio e longo prazo das fintechs?
Rodrigo Soeiro – Quando falamos de fintechs, o que vejo como principais desafios a curto e médio prazo serão sempre acesso ao capital de risco. Hoje, em especial, considerando o momento de total arrefecimento do mercado de investimento em geral, vê-se um risco de perder muitas iniciativas inovadoras dada a falta de acesso a recursos financeiros. Em se falando de Brasil, onde o acesso é menor do que em países do primeiro mundo, perde-se ainda mais. Tenho ciência de que se trata de um cenário momentâneo, mas perderemos bastante até a estabilização do mercado como um todo.
Já a longo prazo, o que vejo como maior desafio é preparar-nos para uma competição global. Atualmente é muito comum ver empresas brasileiras sendo adquiridas por players ou fundos globais. O ideal seria avançarmos globalmente com o mesmo apetite de aquisição e competição, já que temos total condição de competir de igual para igual. Falte, talvez, um pouco de visão e ambição.
MID – Como você vê a entrada de players de outros segmentos no setor financeiro?
Rodrigo Soeiro – Todas as instituições serão basicamente gestores de comunidades. E todos conseguirão prover todo tipo de serviços, desde marketplaces até serviços financeiros. Aí o cliente que se sentir atraído por algum determinado nicho é porque se identifica com aquilo de alguma forma. O marketplace/banco digital que irá atrair aquele indivíduo é porque existe ali uma relação de engajamento muito clara. Estamos vendo instituições, como a Syngenta, atuando e oferecendo banco digital, crédito e uma série de outras frentes com a roupagem ideal para um pecuarista ou agricultor. Bancos digitais como o Nubank vindo com a roupagem ideal para aquele perfil de cliente que ele acredita que interage. Outros players de outros mercados, como a Ambev, também criando suas roupagens, engajando a sua comunidade.
Todo o mercado, seja o varejo, o financeiro ou o agro, vai ter uma oferta completa para os seus clientes e todos eles irão se identificar com um determinado segmento totalmente fracionado por nichos. Vejo todos oferecendo de tudo voltado para o perfil do cliente, e este interagindo com todos um pouquinho, mas porque ele se identifica com uma oferta, que vai atendê-lo cada vez mais e não deixá-lo insatisfeito por algum motivo. O produto vai ficar mais adequado às necessidades daquele indivíduo. Acho que todas as fintechs, healthtechs e agrotechs vão se adequar às necessidades dos seus clientes.
MID – O que isso muda na relação entre cliente e as organizações financeiras?
Rodrigo Soeiro – É o serviço financeiro complementando o atendimento da necessidade do consumidor final. O meio de pagamento vem a agregar nesse sentido. Todos os players terão os seus serviços financeiros ofertados para os seus clientes numa maneira perfeitamente adequada na necessidade deles.
MID – Como você avalia o papel do Banco Central na promoção da inovação no setor financeiro e quais as suas expectativas em relação ao regulador?
Rodrigo Soeiro – Acho que o regulador de maneira geral está de parabéns pela aproximação da inovação que ele tem desempenhado. É um papel desafiador, pois estamos vendo a inovação de maneira cada vez mais rápida. Não é fácil regular um ambiente tão dinâmico. A forma dele continuar se mantendo ágil e acompanhar a inovação é criar mais formatos de sandboxes para poder regular, aderindo a tudo de novo o que está acontecendo e trazendo um ambiente mais competitivo para os players nacionais.
MID – Sobre essa questão de sandbox, existe algum serviço que ainda seja um desafio de tentativa de modernização?
Rodrigo Soeiro – O serviço de câmbio, que ainda não está muito claro como vai ser regulado e que especialmente a criptoeconomia ataca frontalmente, porque é muito mais fácil transacionar de forma transnacional via cripto do que via câmbio. É claramente um setor que precisa ser discutido e entendido como o regulador tratará esse tema.
MID – Na sua avaliação, quais devem ser os próximos passos do PIX?
Rodrigo Soeiro – Ele vai ter que caminhar pra abranger todas as frentes que o cartão está inserido. Já está vindo PIX parcelado, algumas frentes que envolvem o mercado de pagamento de maneira geral. A internacionalização da solução tecnológica vejo como algo valioso e aderi-lo aos CDBCs dará a possibilidade pra gente caminhar no sentido do que falei anteriormente, que é envolver câmbio. Acho que está no caminho certo, na velocidade certa, que só temos a ganhar. O Brasil pode se diferenciar globalmente oferecendo a tecnologia do PIX associada ao CBDC, podendo avançar internacionalmente
MID – Espaço livre, algo a acrescentar?
Rodrigo Soeiro – Até 2022, fintechs e empresas de cripto eram temas distintos, ambientes relativamente
distantes. Hoje, com o avanço da regulação de cripto no mundo, a aceitação e a validação da tecnologia
que envolve este setor, e, principalmente, com a aplicação desta tecnologia através dos Central Bank
Digital Currency, os CBDCs (exemplo, o Real Digital) e os Ativos Tokenizados, vemos que estes mundos
(Fintechs e Criptotechs) estão se fundindo. Todos terão soluções envolvendo um ou outro.
A criptoeconomia é mais uma fronteira a ser transposta e aqueles que se posicionarem primeiro irão
abocanhar seu quinhão. Proponho-me a prepará-los para este movimento antecipadamente.
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